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quarta-feira, 21 de novembro de 2007

As ferramentas da (in)justiça

Tinha nome e sobrenome, família e profissão, o preso que morreu queimado na rebelião de sábado, no Cadeião. O prontuário que restou por lá é pobre, como era pobre José Cícero da Silva, de trinta e seis anos. Vamos lá:

Filiação: Cícero Sarmento da Silva e Maria de Lurdes da Silva;

Nascimento: Maceió, em 18/06/1971;

Profissão: Servente de pedreiro;

Acusação: Furto, artigo 155 do Código Penal.

De fato, José Cícero estava preso, desde dezembro do ano passado, por ter furtado uma "caixa véia de ferramentas"(juiz Marcelo Tadeu). Não consta do seu prontuário que tenha sido ouvido uma vez sequer em audîência na Justiça- apesar de constar, no precário documento, que o preso foi vítima de abuso sexual por parte de outros inquilinos infelizes do estabecimento, o que foi denunciado por um advogado "sem nome", que esteve com ele em junho passado. Chegou a solicitar a transferência do filho de seu Cícero e dona Maria para outro local.
Ao chegar ao Cadeião, o acusado de furto foi colocado na mesma cela em que já estava um estuprador. Na rebelião de março, deram, os próprios presos, no seu código de ética, o mesmo tratamento a ambos. Pior para José Cícero, que não teve nem tempo nem chance de desfazer o equívoco.
Quem seria o responsável pela assassinato, com requintes de crueldade,do filho de seu Cícero e dona Maria? Uma "investigação" fria, desprezando a hipocrisia, poderia apontar:
-Todos, na Justiça, que deveriam tê-lo ouvido e não o fizeram;
-Todos, na polícia, que nele não viram um descuidista que não representava um perigo maior para a sociedade;
-Todos, no sistema prisional, que sabiam das humilhações sofridas por ele e não tomaram qualquer providência;
-Todos os gatunos e gabirus do dinheiro público, de colarinho branco ou não, que roubaram dele(e de tantos) a chance de uma vida digna;
-Todos os dirigentes públicos que não lhe permitiram conhecer uma outra face da vida, que valha, de fato, a pena;
-Todos os que votamos na pior espécie de gente e transferimos a ela a responsabilidade pelo destino da socedade(lavamos as mãos);
-Todos nós que, na mídia, clamamos por vingança e não por justiça(bandido bom é bandido -pobre- morto!).
Claro, nunca seremos julgados por isso. E se fôssemos, certamente negaríamos qualquer relação com tal atrocidade: é impossível lutar contra a própria consciência. Rudolf Hoess, que dirigiu por quatro anos o campo de concentração de Auschwitz, onde morreram 2,5 milhões de pessoas, disse, em conversa com o psiquiatra americano Leon Goldensohn(Entrevistas de Nuremberg - Companhia das Letras), que não se sentia culpado porque nunca tinha matado ninguém pessoalmente.
E nós? Podemos dormir em paz, porque descobrimos a fórmula do crime perfeito.

Fonte: Tudo na Hora
Postado por: Ricardo Mota

Um comentário:

  1. Perfeito , se for para punir que se comece de cima para baixo, e que se puna exemplarmente quem errou , começando pelos juízes , promotores , defensores públicos , polícias militares e civis , e por ultimo os diretores e agentes , mas em regra o que acontece é diferente , há uma inversão na ordem das punições, o problema começa aí, sempre querem punir o mais fraco para se dar exemplo e o mais fraco nesta história é o agente.

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